Antes de abrir as portas da entrada da escola, estranhou a falta de barulho do outro lado da madeira. Ao abrir e deparar-se com o extenso corredor vazio, estranhou, mas talvez o sinal já houvesse tocado. Porém, passando pelas portas, percebeu que realmente não havia ninguém. Franziu o cenho tentando recordar que dia era aquele e o motivo de estar em uma escola vazia. Aliás, o motivo de estar dentro da escola visto que perdera os três últimos dias de aula fumando e passando tempo embaixo dos bancos do campo de futebol.
O pensamento foi interrompido pela melodia vinda de não muito longe. Já sabia de onde e quem encontraria. Continuou pelo corredor, dobrou à esquerda e em poucos passos chegou ao auditório. Abriu a porta lentamente, sem querer fazer barulho e interromper a outra pessoa. Deu alguns passos até avistar a figura feminina tocando as últimas notas no piano preto bem no centro do palco. Sorriu por hábito. Sempre que via ou ouvia a outra, sentia a sensação de formigamento no corpo e o pescoço esquentar. Era uma sensação boa e dava vontade de sorrir.
Ao fim da música, aproximou-se de forma a ser vista pela morena que continuava sentada, com as mãos ainda sobre as teclas do piano e, ao ouvir os passos se aproximando, levantou a cabeça e encarou a loura que invadia o cômodo.
Pelo cenho franzido e o misto de surpresa e raiva, a loura esperava um longo discurso sobre seu comportamento nas últimas semanas e, possivelmente, mais uma tentativa de conversa da qual a loura ouviria por cinco minutos antes de, novamente, dar as costas e ir embora sabendo que apenas magoara mais a morena.
Pensando assim e sabendo todas as reações, a pergunta era porquê diabos continuava com aquilo? Estava mesmo cansada de sempre machucar os outros. Principalmente ela.
Contudo, o que ouviu não parecia ser uma tentativa de fazer as pazes.
"O que você está fazendo aqui, Quinn?" Perguntou Rachel raivosamente levantando-se. "Você não deveria estar aqui. Você não pode estar aqui. Vá embora." Disse em tom de ordem.
Quinn ergueu uma sobrancelha, e encarou Rachel como se a desafiasse a força-la a ir embora. Há pouco mais de um ano, talvez Rachel tivesse deixado-se intimar por aquela pose, mas, provavelmente, Quinn ainda estaria usando o uniforme vermelho e branco. Agora, Rachel a encarava um pouco menos irritada e um pouco mais assustada, mas o medo não parecia ser por conta da loura. Não totalmente.
"Você precisa ir embora, Quinn. Não é para você estar aqui." Olhou para os lados, parecendo alarmada, o que fez Quinn relaxar na pose, mas, logo em seguida, ficar em alerta sobre o perigo que ela nem sabia qual era. "Por que você está aqui, Quinn?" Perguntou a morena voltando a encará-la.
"É estranho. Tenho a sensação de que estava em outro lugar, mas, de repente, eu estava na frente da escola. E quando entrei, não havia ninguém." Franziu o cenho como se tentasse lembrar de algo. "Que dia é hoje? Por que você está aqui?"
Rachel a olhou totalmente surpresa como se Quinn não saber o motivo de ambas estarem ali fosse algo absurdo. E, para a morena, realmente era. Desde que chegara, sabia o porque de estar lá, sozinha.
"Você não soube." Disse sorrindo tristemente fazendo a loura sentir uma pontada no peito. "E também não lembra o motivo de estar aqui." Não sorria mais.
"O que está havendo, Rachel?" Perguntou finalmente. "Não há ninguém aqui e você está agindo como se realmente fosse para ser assim."
"Sente, Quinn." Apontou para uma cadeira atrás da loura que tinha certeza de não ter estado lá quando entrou, mas sentou mesmo assim. "Não sei dizer que dia estamos. E não, não deveria haver mais ninguém aqui além de mim. Aliás, não sei como você conseguiu chegar aqui."
"Estudo aqui também, Rachel, caso não tenha notado ainda." Rolou os olhos e levantou. "Se quer tanto que eu vá embora, eu vou." Deu as costas e já tocava a maçaneta quando sentiu a morena tocar-lhe o braço.
"Eu não quero ficar sozinha." Disse suavemente fazendo a loura encara-la. "Mas você não pode ficar aqui." Fechou ainda mais a mão no braço da outra. "Irei ajudá-la a encontrar a saída, mas precisamos ser rápidas."
"Acho que sei encontrar a saída da minha própria escola." Abriu a porta do auditório que levava ao corredor, mas quando passou por ela, não viu os armários e percebeu não estar mais dentro da escola.
O quarto à frente tinha as paredes de um violeta claro. Havia apenas uma cama de casal, uma penteadeira do lado esquerdo com algumas fotos coladas no espelho oval e uma porta do lado direito que levava ao closet junto do banheiro. Sobre a cama desarrumada, tinha um livro com as folhas já amareladas e um isqueiro. Contudo, o que chamou a atenção foi ver Rachel em pé, de frente a penteadeira, olhando fixamente uma foto em particular: ela e Quinn abraçadas, olhando uma pra a outra, ambas sorrindo.
"Eu fiz você feliz, Quinn?" A morena perguntou ainda encarando a foto.
Talvez a pergunta fosse válida, mas a loura estava mais preocupada em saber como elas foram parar em seu quarto quando há poucos instantes estavam no auditório da escola. Aproximou-se da outra, mas resolveu não chegar muito perto. Não sabia o motivo de se manter distante, gostava da proximidade das duas.
"Você é a pessoa que mais me faz feliz, Rachel." A morena a encarou inexpressiva. "Como viemos parar no meu quarto?" Perguntou querendo não se sentir tão vulnerável e exposta sob aquele olhar.
"Seu quarto está diferente da última vez que vim." Disse a morena olhando ao redor, percebendo a falta de móveis. "Você precisa lembrar, Quinn." Encarou a outra. De repente, o despertador sobre a penteadeira toca assustando a loura. "Precisamos continuar." Passando pela loura, foi até a porta por onde Quinn entrou e a abriu. Passando por ela, ambas estavam de volta aos corredores de McKinley.
Quinn sabia que não estava sonhando, apesar de tudo estar surreal até demais. Rachel já estava alguns passos à frente, andando com a mesma determinação de quando todos na escola a tinham como alvo. A loura bloqueou pensar nisso naquele momento e se forçou a seguir a morena.
Rachel era, como diziam, presa fácil naquela pequena cidade habitada por uma maioria discriminatória. E ter dois pais, sendo um negro e outro judeu era bastante chamativo. Desde que se entendia por gente, recebia desde olhares tortos às piadas de conteúdo homofóbico e racistas. Além disso, as outras crianças nunca a aceitaram em seus círculos de amizade. A maioria dizia que ela era mimada, egoísta e se vestia como se tivesse deixado um cego escolher suas roupas. Tirando a ignorância geral das pessoas, a morena não entendeu o motivo de tanta hostilidade.
Ela não era mimada como diziam. Ser filha única tinha sim suas vantagens, e a morena era muito agradecida por seus pais poderem lhe dar coleções completas de filmes, jogos de karaokê, posters, CD's, blusas e canecas com tema de apresentações da Broadway, além das coisas básicas como comida, roupas, material de higiene, eletrônicos e um ou outro presente. Não, Rachel Berry não era mimada. Apenas gostava de ter tudo que a interessasse, mas tudo que conseguia ter era por merecer. Seus pais a disciplinaram bem e a ensinaram sobre limites. E a garota sempre aceitou em dividir, mas a maioria das pessoas não se interessavam em compartilhar com ela ou, quando aceitavam, se aproveitavam.
E ela não era egoísta como pensavam que ela fosse. Porque Rachel sabia quanto uma boa ação pode mudar o dia de alguém. Ou uma má. Ainda que a morena quisesse sim ter toda a atenção para si e sempre que tinha a oportunidade, falava de seu futuro como diva com muita fama e sucesso. Contudo, ela nunca esquecia que havia pessoas necessitando bem mais do que ela. Isso fez com que, por um mês, ela desse seu dinheiro do lanche para um sem-teto que passava em frente a sua casa todo dia. Indo mais além, a morena era voluntária em, praticamente, metade dos centros de ajuda que havia na cidade. Ela gostava das tardes em que contava histórias para as crianças – quase ninguém sabe, mas ela era ótima em inventar contos de fada e sempre imitava cada personagem, o que lhe dava a oportunidade de treinar para seu futuro nos palcos -. Também adorava as tardes em que jogava xadrez com os idosos – seu pai quem a ensinou, seu outro pai já não era tão bom em jogos de estratégia -. Não lhe era permitido ter um bichinho de estimação por conta de todos passarem muito tempo fora de casa, mas isso não impedia a morena de ajudar nos centros de resgates e canis. Rachel inclusive oferecia ajuda aos colegas de classe, mas a maioria não aceitava dizendo que seria ruim para a reputação andar com alguém como ela. E uma vez que aceitaram, era tudo parte uma brincadeira de muito mau gosto.
Rachel, apesar de tudo, sempre tentava ver o melhor nas pessoas e nas intenções alheias. Ainda que, muitas vezes, sofresse com isso. Principalmente quando quem decidia implicar com ela era Quinn Fabray. Uma garota com rosto de anjo e que fazia o estilo de filha- perfeita-membro-de-uma-família-americana-perfeita.
Quinn sempre foi uma líder. Mesmo quando crianças era ela quem mandava os garotos puxar o cabelo de Rachel, pular em poças de lama quando ela estivesse próxima para sujar suas roupas, jogar minhocas em sua cabeça entre outras maldades. Quando se tornaram colegiais, a morena tinha esperanças que todos tivessem amadurecido e, finalmente, iriam aceita-la, mas os hormônios explodindo e a necessidade de pertencer a um grupo fez com que as brincadeiras evoluíssem. Eram banhos de raspadinha, desenhos pornográficos em banheiros, objetos furtados e abandonados em locais de difícil acesso e empurrões contra os armários. Quinn, é claro, era a mandante da maioria dessas ações. A loura, depois de se tornar chefe das líderes de torcida, pareceu se acalmar por um tempo, mas logo encaixou um horário para atormentar a morena.
Ninguém entendia de onde vinha tanto rancor e criatividade para atacar a outra. E ninguém questionava ou poderia ser a próxima vítima. As pessoas mais próximas de entender o que se passava na cabeça da loura eram suas duas melhores amigas, Santana Lopez e Brittany Pierce. Ambas também faziam parte das líderes de torcida e, as três, eram como imãs; sempre juntas. Ainda que a personalidade de cada uma fosse bem diferente.
Santana sempre foi uma pessoa ameaçadora em matéria de força bruta. Não que ela fosse uma brutamontes gigante estilo segurança de boate, mas havia rumores de que seu soco de direita era realmente doloroso. E mordidas que tiravam sangue. E pequenos incêndios isolados. E um ou outro aluno que nunca mais foi visto, ainda que o diretor tenha dito se tratar de uma transferência de escola – mas quem se transfere para uma ilha no sul do país após dois meses de aula e logo depois de um incidente com Lopez? Duas vezes Rachel foi vítima de empurrões contra armários provocados pela Latina, e em ambas as vezes, o roxo do braço demorou quase duas semanas para sumir por completo.
Brittany já era o total inverso da latina. A loura era a pessoa mais ingênua e meiga que Rachel conhecia. Um pouco desorientada e imaginativa, mas nada que a fizesse um caso perdido apesar de muitos a acharem uma completa estúpida e uns mais corajosos terem verbalizado tal pensamento – como os dois alunos que parecem terem sido engolidos pela Terra depois que Santana os confrontou -.
Quinn era a abelha rainha da escola. Provavelmente, da cidade. Mais provável ainda, de qualquer lugar que chegasse a ir. Sua beleza e sagacidade abriam muitas portas. Apenas a sua presença já era bastante intimidadora. E quando não, bastava encarar a pessoa por alguns segundos e erguer uma das sobrancelhas. Rachel dificilmente se encontrava face-a-face com o diabo, mas quando acontecia, conseguia lembrar das rezas em hebraico que seu avô lhe ensinara quando menor e cobrava nas festas de fim de ano – ela nunca conseguia recitar corretamente até o fim quando ele pedia, mas bastava a loura aparecer em seu campo de visão que a morena recitava mentalmente cada palavra perfeitamente bem -.
Ser uma colegial não era tão mais difícil do que quando não era. Rachel sempre fazia os trabalhos acadêmicos sozinha, a menos que algum professor percebesse que seria muito trabalho para uma pessoa só e a jogava em algum grupo que a recebia mal. Nunca pisou no refeitório da escola, tirando o primeiro dia, onde teve a bandeja derrubada sobre o vestido novo e que teve o fim trágico do fundo de uma lata de lixo. Desse dia em diante, comia sozinha no auditório. Não tinha amigos de sua idade. E prendia a respiração sempre que via algum jogador ou líder de torcida andando em sua direção.
Seus pais tentaram persuadi-la a mudar de escola, mas Rachel não aceitou dizendo que quando fosse famosa, precisaria de um passado sofrido e inspirador para quando escrevessem sua biografia. Com o passar dos anos, a morena sentia-se tentada a aceitar a transferência, mas o orgulho era maior e passou a levar trocas de roupa e enganar os pais dizendo que as coisas estavam melhorando. Mesmo que eles sempre encontrassem alguma peça de roupa manchada jogada no lixo.
Mas as coisas realmente pareciam melhorar depois que Rachel conseguiu um novo professor para o clube de coral. O senhor Schuester era um bom professor ainda que a morena insistisse de que ele queria sabotar sua meta de tornar-se uma estrela da Broadway. E, com o clube conseguindo mais pessoas – até alguns jogadores de futebol se juntaram mesmo que, de início obrigados por Quinn que, pasmem, entrou no clube junto de Santana e Brittany -, Rachel conseguia finalmente se ver parte de um grupo. Apesar dela continuar fechando os ouvidos sempre que os demais membros do clube comentavam alguma coisa contra sua pessoa – o que era basicamente todo dia, mas tudo bem, quando ela for famosa todos eles estarão implorando por alguma ajuda da parte dela -.
Então as coisas chegaram em um ponto de constância quando Quinn engravidou do melhor amigo do namorado e todos descobriram a verdade. A loura foi expulsa do time de torcida, recebeu toda a ajuda possível de todos do Nova Direções, e passou a morar com Santana após ser expulsa de casa pelo pai e sua mãe não fazer nada. Rachel ainda tentou oferecer apoio no que quer que fosse, mas depois da terceira rejeição, conformou-se em ser uma mera espectadora, mas sempre estava por perto.
Estava por perto quando a loura quase tomba em um dos ensaios em grupo. A morena conseguiu segura-la bem na hora, mas logo que a loura conseguiu o equilíbrio de volta, a morena foi empurrada para o lado. Estava perto quando um jogador calouro de futebol quis mostrar-se corajoso e aproximava com um copo de raspadinha pronto para jogar na loura, mas Rachel se meteu na frente bem na hora. Em pouco segundos, Santana surgiu sabe-se lá de onde e confrontou o rapaz que tentou atacar sua melhor amiga. Rachel foi esquecida no canto, coberta por uma gosma azul e, resignada se arrastou ao banheiro mais próximo. Estava perto quando Quinn vomitava a alma em uma manhã de enjôo matinal e precisou ser deixada na casa dos Lopez. Consuelo Lopez bem que quis que a morena ficasse para o jantar, mas Quinn a encarou desafiando-a a aceitar o convite. Rachel não queria morrer antes de ganhar, pelo menos, um Tony, então inventou uma desculpa qualquer e saiu de lá o mais rápido possível. Estava perto quando chegou ainda mais cedo do que de costume na sala de coral e encontrou a loura chorando de uma forma tão intensa que a morena chegou a pensar se haveria a possibilidade da outra ficar desidratada. Após quase quarenta minutos tentando acalma-la, Brittany apareceu e conduziu Quinn para longe depois de agradecer Rachel por mandar um amigo duende avisa-la que a amiga não estava bem. Estava perto quando a bolsa estourou logo após a apresentação nas Seletivas e, por força maior, estavam sozinhas em um corredor atrás do palco. Ambas se olharem em pânico até que Rachel guiou a loura para a rua, parou um táxi se jogando bem na frente dele – literalmente – e acompanhou Quinn durante todas as cinco horas de parto. Teria se comunicado mais cedo com o restante do grupo, ou algum adulto responsável, mas com a pressa esquecera o celular e a loura não a deixara se afastar. Um raio-x, a confirmação da mão direita quebrada e um gesso depois, a morena avisou aos demais onde estavam, recebeu ameaças pela parte de Santana, e um abraço de agradecimento da parte de Brittany, e deixou o hospital logo que soube que mãe e filha passavam bem e viu os demais colegas entrando no quarto da loura.
Rachel não esperava qualquer tipo de agradecimento da parte de Quinn. Ela queria e até imaginou os diversos cenários, mas sabia que não teria um na vida real. Contudo, saber que Shelby Cocoran - sua mãe biológica, que a teve e a deu por dinheiro e uma chance na Broadway, que a rejeitou pela segunda vez quando mãe e filha se reencontraram em uma competição de coral -, foi a mãe adotiva seleciona por Quinn, a morena faltou dez dias de aula e aumentou as sessões com a psicóloga de duas para três vezes por semana.
Após as férias de verão, Quinn voltou a ser a chefe das líderes de torcida e tudo voltou a ser como antes. Um pouco pior visto que o banho de raspadinha passou a ser até cinco vezes por semana e até alunos calouros a escolhiam como vítima de brincadeiras infames.
Era um sábado quando estava na ala infantil do mesmo hospital em que Quinn dera a luz. Aquela tarde iria contar histórias para as crianças com câncer. Usava um vestido novo e tinha o cabelo preso em um rabo de cavalo. Passara a manhã preparando biscoitos e cupcakes de diversos sabores. Quando entrou na área comum da ala, não se surpreendeu ao encontrar Brittany em roupas de dança ensinando alguns passos para as crianças. De vez em quando, as duas se encontravam fora da escola em algum centro comunitário ou no hospital, mas Rachel não se atrevia a levar aquela amizade secreta para a escola. Esperou alguns minutos, até a aula acabar, então aplaudiu chamando atenção para si. As crianças sorriram e correram para abraça-la para, logo depois darem espaço para Brittany receber a outra.
"El!" Exclamou a dançarina praticamente se jogando na morena e abraçando forte sendo retribuída. "Eu gostei do seu vestido novo." Comentou afastando-se e analisando melhor a morena que não fazia ideia de como a outra sabia se tratar de uma roupa nova. "Você deveria prender o cabelo mais vezes. Você tem um rosto bonito."
"Obrigada, Ny." Disse corada. Brittany era uma das poucas pessoas, além de seus pais e familiares, que a elogiava. "O que você estava ensinando hoje?"
"Salsa!" Disse excitada puxando a morena pela mão até o centro da sala. As crianças estavam sentadas, espalhadas, esperando pela história. "Qual história você vai contar hoje?" Perguntou sentando em um espaço na poltrona e puxada uma das crianças consigo.
"Você vai saber quando eu contar, Ny." Piscou sorridente.
Após distribuir os biscoitos e cupcakes, beber alguns goles de água e ter toda a atenção para si, Rachel paralisou ao ver duas figuras entrando no cômodo. Brittany seguiu o olhar da amiga, mas diferente desta, acenou alegremente para as figuras de Quinn e Santana que vinha se aproximando. Por instinto, Rachel deu um passo para trás e buscou pela saída mais rápida não tendo muita esperança que as duas não fizessem ou falassem nada contra ela - mesmo estando em um hospital e na frente de várias crianças, enfermeiras e alguns pais.
"Que bom que puderam vir." Disse Brittany sorrindo e apontando para dois lugares vazios perto de si. "El ainda não começou a contar a história. Ela trouxe biscoitos e cupcakes dessa vez. El cozinha muito bem, vocês vão gostar."
Santana encarou Rachel como se decidindo entre atacar ou brincar um pouco antes do golpe fatal. Já Quinn, a encarava de forma curiosa e até surpresa.
"Você é a El?" Perguntou a loura erguendo uma sobrancelha. Rachel não confiava na própria voz naquele momento e apenas acenou confirmando o apelido.
"Por que nunca nos disse que a mãos-de-homem era a sua amiga secreta, Britt?" Perguntou Santana ainda encarando Rachel.
"Mas eu disse." Franziu o cenho. "Quem mais tem a voz bonita, gosta de amarelo, é pequena e veste roupas estranhas, mas bonitas e que me lembram bonecas?"
"Então, El, que história vai contar hoje?" Perguntou Quinn parecendo se divertir com aquele encontro inusitado.
"Preferia que não me chamasse assim, Quinn. Brittany quem criou tal apelido e não acho certo que alguém além dela o use." Engoliu em seco quando viu os olhos da loura cerrar. Brittany apenas acenou com a cabeça concordando.
"Apenas comece a história, sua transexual."
Rachel quis dar um de seus longos discursos a respeito de não ser um transexual, apesar de não se sentir ofendida por ser chamada de um, mas quando uma das crianças perguntou o que a palavra significava, achou melhor começar a história antes que sua vontade de educar a todos ali sobre sexualidade, prevalecesse.
Ao fim, todos bateram palmas. Mesmo Quinn e Santana, ainda que esta precisou de um cutucão por parte de Brittany. Quando a maioria das crianças já tinha deixado a área, Brittany arrastou Santana para um canto da sala e engajou em uma conversa com uma menina loura de nove anos. Rachel viu Quinn levantar e, com graciosidade, aproximar-sei. Fingiu estar juntando alguns brinquedos espalhados esperando que a loura mudasse seu caminho.
"Você é realmente muito boa em contar histórias." Deu uma mordida no restante no cupcake que tinha em mãos. "E em cozinhar. Achei que você e sua família comiam apenas por delivery."
"Como é de conhecimento da maioria, aproveito cada oportunidade para aprimorar minha presença no palco e meu talento para o teatro. Fico feliz que tenha gostado da minha encenação de hoje. E quanto a minha habilidade culinária, meus pais e eu preferimos pedir comida em casa por conta do pouco tempo que temos para cozinhar nós mesmos a maioria das refeições, mas sempre que podemos, o fazemos."
"Você não é capaz mesmo de aceitar um elogio com apenas um obrigado." Rachel decidiu não responder. Provavelmente falaria um novo monólogo e isso poderia irritar mais a loura que poderia ataca-la com um bisturi, deixa-la inconsciente e joga-la numa maca alegando te-la encontrado em algum beco. "Este sábado vai ter uma festa lá em casa. Vista algo que me impeça de saber a cor da sua calcinha." A morena corou. Com certeza, as saias que usava tinham mais pano do que o uniforme de líder de torcida. "19h e não se atrase."
"Ignorando seu tom de ordem, me questiono o motivo do convite porque certamente você não está me confundindo com outra pessoa, a menos que você esteja sofrendo de alucinação o que pode ser um sintoma de tumor no cérebro e... Oh, meu Deus, Quinn, você não está doente, está?" Perguntou ansiosa pensando nos demais sintomas de tumor e buscando na memória todos os encontros que tivera com a loura para saber se deixou passar algum sinal da doença.
"Não estou doente. Não posso chama-la para uma festa sem estar morrendo?"
"Que bom que está saudável e que tenha pleno conhecimento do funcionamento de seu corpo. E sinto muito em ser cética quanto ao seu convite e questionar suas razões para o mesmo, mas nós não somos amigas e você sempre fez questão de afirmar e demonstrar isso mesmo eu tendo, diversas vezes, tentando uma aproximação."
"Apenas apareça." Deu de ombros.
"Isso é mais um plano elaborado com o intuito de me humilhar? Novamente?"
"Pare de ser tão pessimista sobre mim. É apenas uma festa com todo mundo do coral."
"A presença dos nossos colegas de classes e coral não faz com que eu me sinta mais segura, na verdade." Falou amarga e olhando para o chão, com os braços soltos e sua aparência era como a de quem carregava algo muito pesado. Quinn cruzou os braços, não esperando aquela confissão, apesar de fazer sentido.
"Não vai haver nenhuma humilhação. É somente uma festa." Repetiu.
"Ei, Q, vamos!" Chamou Santana mais afastada. Brittany terminava de se despedir de uma das crianças.
"Te vejo na escola." Disse a loura dando as costas para Rachel e indo embora.
Muito bem, ainda era quinta-feira, o que deixava a morena com dois dias para decidir se acreditava mais uma vez no rosto angelical e nas palavras surpreendentemente sem ódio para, mais tarde, se decepcionar novamente e ter mais um vídeo de humilhação no YouTube.
Claro que Quinn poderia estar apenas a convidando para uma festa real apenas com o intuito de inclui-la no grupo. Contundo, nem mesmo Rachel era tão ingênua. Caso deixasse a curiosidade tomar-lhe de conta, precisaria levar o celular carregado, escolher uma roupa que não fizesse tanta falta depois de manchada, e pedir que seus pais a ligassem a cada trinta minutos apenas para que se assegurassem de que estava viva e consciente.
Quinn não lembrava da escola ser tão grande e cheia de corredores e portas. Rachel seguia na frente, andando com a cabeça erguida, corpo levemente inclinado para frente e uma expressão determinada. A loura sempre admirou em como a outra nunca se deixava abater. Mesmo com todas as ações e palavras crueis, Rachel ignorava a tudo e todos que lhe eram prejudiciais e continuava seu caminho. Seus olhos sempre brilhando de coragem e sua postura sempre pronta para receber a próxima raspadinha sem deixar que a parassem.
Desde pequena, Quinn foi ensinada a ser a pessoa perfeita e a nunca demonstrar sentimentos ou pedir ajuda. Qualquer problema maior era ignorado. Seu pai sempre teve a esposa e as filhas como troféus por serem belas mulheres que sabiam manter uma conversa interessante e eram bem educadas. Recorrer a ele era somente quando precisa de dinheiro para sair ou pedir permissão para algo. Sua mãe era um pouco mais presente. Ela lhe comprou seu primeiro sutiã e teve a conversa embaraçosa sobre menstruação, mas Quinn nunca se sentiu confortável para falar de algo além de roupas e maquiagem. Mesmo quando namorava Finn, elas nunca conversaram sobre sexo. Ou qualquer coisa relacionada. Não conversavam nem mesmo sobre coisas banais como amigos, escola – além de perguntar sobre as notas -, livros, programas de tv, sonhos. Não conversava sobre essas coisas nem mesmo com sua irmã. Na verdade, a diferença de idade atrapalhava as irmãs Fabray em terem coisas em comum.
Ainda pequena, em seu primeiro dia no jardim de infância, ao conhecer Rachel sabia que tinha de odia-la. A morena era a filha do pecado: dois pais, sendo um judeu. E quando ela falava, ninguém conseguiu acompanhar. Suas roupas pareciam versões maiores de roupas de bonecas que a avô de Quinn colecionava. E Rachel era ambiciosa, mesmo criança já falava sobre shows da Broadway e em como seria famosa quando mais velha. A pessoas não gostava de alguém que sabe que que quer. Isso faz o resto das pessoas se sentir mais perdidas. E Quinn era uma dessas pessoas perdidas.
Então a loura escolheu o mais simples; faria com que Rachel se perdesse também. Porém, nunca se fez a prática. E parte de Quinn gostava de ver a morena ignorar cada obstáculo que a loura lhe jogava. E em parte, Quinn queria saber se havia um limite na determinação da outra.
Quando a loura engravidou, parou de ser a pessoa mais assustadora da escola – mas não menos intimidadora. Então todos souberam a real identidade do pai e o seu próprio a expulsou de casa. Quinn nunca esquecera da raiva de Russell e da rejeição de Judy ao ficar acuada vendo a filha mais nova fazer as malas e sair de casa chorando sem destino. Santana quem a acolheu após a segunda noite de Quinn usar um tatame e dormir na sala de coral da escola. Se a latina não a tivesse pressionado, a loura jamais diria sobre a noite fatídica onde foi deserdada.
A partir daí, as coisas passaram a melhorar. Finn continuava magoado por ter sido enganado – e mais ainda por ter acreditado na mentira -, mas ele, Puck e a loura conseguiam ter uma convivência pacífica. E todos do grupo do coral a apoiavam quando precisava, mas a única pessoa que estava lá incondicionalmente, mesmo contra a vontade da loura, era Rachel.
A morena lhe aparecia com livros sobre gravidez na adolescência, maternidade, nomes para bebes e outros. E sempre lhe oferecia água e barras de cereais tirados de sabe-se lá onde porque uma mulher grávida precisa do máximo de hidratação e nutrientes possível. Rachel também se dispunha a carregar os livros, puxar portas e cadeiras e, fazer companhia enquanto vomitava as tripas por conta do enjôo matinal ou do cheiro de alguma comida em particular preparada no refeitório.
Rachel também foi quem a segurou firmemente numa tarde de ensaio de ensaio em grupo. A loura errou o passo e tropeçou no próprio pé. Fechara os olhos esperando a queda que nunca veio porque dois braços a puxaram de volta. Quinn nunca perceberam na força da outra até esse momento. E, aos nove meses de gravidez, enquanto voltava do banheiro em meio a uma competição de coral, era a morena que estava presente quando sua bolsa estourou. Numa decisão rápida, por parte de Rachel, ambas estavam dentro de um táxi indo para o hospital - táxi que a morena parou se jogando na frente fazendo Quinn esquecer a dor da contração por alguns segundos paralisada de medo, e de surpresa, e imaginar o que diria aos outros quando tivesse de explicar porque Rachel estava em uma cirurgia enquanto a loura estava dando a luz -.
Quase dois dias após Beth nascer, Quinn juntou toda a sua coragem e assinou os papéis de adoção deixando que Shelby Cocoran, mãe biológica de Rachel, levasse sua – não legalmente - filha embora. A loura, por muito tempo, se forçou a acreditar que escolhera Shelby porque a mulher oferecia tudo o que Beth precisava, mas no fundo sabia que assim estaria sempre ligada, de alguma forma, à Rachel.
Três meses depois, Quinn voltava ao colégio como chefe das líderes de torcida e morando novamente com a mãe. Russell foi expulso de casa após Judy ter o bom senso de escolher a filha sem-teto e mãe adolescente, ao marido distante e indiferente.
Rachel voltou a ser alvo de seu desafeto, mas somente porque a morena a deixara sozinha logo após o nascimento de Beth e, por três meses, não tentou entrar em contato. Quinn se sentiu rejeitada e voltou querendo vingança pelo tratamento silencioso. Não que a morena soubesse disso ou mesmo merecesse, é claro.
E em uma tarde após Brittany passar horas falando de como sua amiga El sabia cantar, cozinhar bem, gostava de amarelo e era tão pequena que a dançarina queria leva-la consigo o tempo todo, Quinn decidiu que queria conhecer tal pessoa. Santana aderiu a ideia, ainda que achasse que a namorada estivesse falando de um de seus amigos imaginários. Foi uma surpresa saber que El era realmente uma pessoa real. Mais surpresa ainda foi descobrir que se tratava de Rachel.
Em uma decisão de último momento, após Rachel divertir a todos em uma encenação perfeita de um faz-de-conta, Quinn convidou a morena para uma festa em sua casa – a verdade era que queria chamar a outra para uma tarde de filmes e comida calóricas, mas sabia que Rachel provavelmente sairia correndo alegando ser o fim do mundo, isso ou cantaria algo de mesma dramaticidade. Contundo, o convite foi recebido com desconfiança – com razões – por parte da morena. E isso fez um misto de emoções na loura que sabia que não tinha direito de ter raiva ou mágoa, mas ainda assim os tinha.
Finalmente Rachel parou de andar fazendo Quinn quase colidir com ela por não estar prestando mais atenção no caminho depois de tantas voltas. A morena parecia incerta de abrir ou não a porta a frente. Quinn a tocou gentilmente no braço, sendo encarada pelas orbes castanhas e, num segundo de decisão, a morena girou a maçaneta.
A cozinha não era muito grande. Cinco pessoas poderiam andar por ela perfeitamente bem. Quinn reconheceu sendo a cozinha da casa do senhor Schuester, ainda que a geladeira tenha sido mudada de lugar e houvesse alguns enfeites femininos, claramente postos pela senhora Pillsbury. Rachel estava de pé, em frente a pia, terminando de lavar algumas xícaras e pratos.
"Deseja beber algo, Quinn?" Perguntou a morena calmamente, como se aquela fosse sua cozinha e elas não tivessem acabado de, magicamente, mudarem novamente de ambiente. "Peço desculpas pela bagunça, mas o senhor Schuester e a senhora Pillsbury andam sem tempo de lavar a louça ultimamente." Apontou a cadeira pedindo que a loura senta-se.
"Por que você está lavando a louça deles?"
"Eu sou a razão dela estar suja." Disse como se fosse óbvio. "E também sou a razão dela ter sido esquecida."
"Você os tem visitado muito?" Perguntou curiosa e desconfiada. Caso a resposta fosse afirmativa, o que levaria Rachel a visitar tanto um professor e uma conselheira da escola?
"Claro que não. As pessoas dessa cidade possuem a mente pequena e logo pensam em conclusões maliciosas." Terminou de lavar o último prato e passou a enxuga-lo. "Não tenho nenhum problema em visita-los, mas sei que poderiam questionar minha motivação. Contudo, uma das últimas reuniões de grupo que tivemos foi aqui. Acredito que não é muito suspeito um grupo de crianças de coral visitar seu professor de coral com sua noiva presente. Ainda mais nas circunstancias em que estávamos."
"Noiva? Will e Emma estão noivas?"
"Há exatas quatro semana, sim." Parou de enxugar a louça. "Eles quiseram que você fizesse parte das comemorações, Quinn." E encarou a loura. "Não consegui deixar de imaginar você me pedindo em casamento."
"Não acha um pouco cedo?" Sorriu de lado. "E por que eu quem iria propor?"
"Não importa mais. Não é como se fosse acontecer, de qualquer jeito." Quinn franziu o cenho percebendo a tristeza na voz da outra. Queria dizer que ainda poderia acontecer. Que já imaginara as duas casadas, morando em Nova Iorque, Rachel sendo uma estrela do teatro e ela sendo... bom, qualquer coisa desde que pudesse pagar as contas e comprar presentes pra morena. Queria dizer que imaginava uma garotinha com os mesmos olhos castanhos e o mesmo gosto musical. Queria dizer muito mais coisas. "Quando você sair daqui, espero que encontre a pessoa certa para você. Que essa pessoa cuide de você e que você a deixe entrar completamente na sua vida. Espero que vocês sejam imensamente felizes." Virou sorrindo. Seus olhos estavam molhados, mas ela segurava as lágrimas.
"Rachel"
"Você sempre quis morar no campo, Quinn. Espero que possam morar no campo." Suspirou parecendo muito cansada. "Guie seus filhos bem, Quinn. Não os proteja demais, mas não os negligencie. Você será uma ótima mãe, Quinn. No tempo certo, claro. E sei que Beth ficará feliz em ser uma irmã mais velha."
"Por que você fala como se não fosse acompanhar tudo isso? Mesmo se não chegarmos a nos casar, você ainda seria minha amiga, certo?" Perguntou insegura.
"Claro que seriamos amigas!" Estendeu o pano sobre a pia. "Mas não creio que poderei estar mais presente em sua vida, Quinn. Não por escolha minha, é claro."
"Então por quê?"
Um bipe vindo do forno irradiou pelo cômodo chamando a atenção das duas.
"Precisamos continuar. Se você pretende formar uma família, preciso tira-la daqui." E seguiu para a porta que levava a ligação com a sala de estar. Quinn a seguiu conformada e em silêncio, mas querendo dizer que pretendia ter uma família com ela.
No sábado pela manhã, Rachel sentara na entrada de seu closet, com uma taça de sorvete em mãos e tentando se decidir por uma roupa que pudesse jogar no lixo, mais tarde, sem tanto apego. Havia decidido comparecer a festa na mansão Fabray, e passara as primeiras horas daquele dia se preparando psicologicamente para qualquer coisa que pudesse acontecer à noite. Pensou em todos os cenários e se achava preparada até mesmo caso tentassem roubar suas roupas e força-la a deixar a festa nua e a pé de volta para casa. Não teve coragem de contar aos pais aonde realmente ia. Dissera que dormiria na casa da senhora Kimmel e eles aceitaram achando que a velha senhora estivesse nos momentos de muita saudade dos filhos crescidos e casados, e tivesse pedido que Rachel lhe desse um pouco de companhia.
Quinn não havia lhe chamado para dormir lá após a festa, mas a morena decidiu que não voltaria para casa após mais uma humilhação de seus colegas. Não queria que seus pais a vissem chorando – novamente -.
Como não poderia contar com as ligações a cada trinta minutos de seus pais – ou qualquer outra pessoa -, a morena configurou o alarme do próprio celular e fingiria ser uma mensagem de seus pais pedindo que voltasse imediatamente para casa. Com sorte, todos os presentes estariam bêbados demais para perceber a fraude. E, no pior das hipóteses, estaria levando o canivete suíço do pai que possuía GPS. Rachel não entendia a razão de ter um canivete-celular, mas naquele momento, achou o dinheiro absurdo que fora gasto com aquele objeto finalmente válido.
Havia saído de casa exatamente às 18h30. Tinha resolvido ir a pé, mas estava levando uma lasanha vegana e brownie. Não poderia carregar ambas as bandejas até a casa da loura mesmo não sendo muito longe. Esperava que levando comida, seja qual fosse a pegadinha, a loura fosse um pouco misericordiosa. Além disso, precisava de um canto para dormir e sustentar a mentira que contara aos pais.
Claro que Quinn sempre poderia jogar a comida em sua cara e furar os pneus de seu carro, mas a morena preferia não seguir essa linha de raciocínio.
Dobrando na rua da loura, passou a respirar mais pausadamente e pensar em uma lista de prós e contras em ir à festa e em passar direto e voltar para casa. A mentira de voltar mais cedo já estava na ponta da língua, é claro, mas parando o carro em frente a mansão Fabray às exata 19h, Rachel respirou fundo e abriu a porta.
Talvez Quinn tivesse ouvido o motor do carro ou, por acaso, havia decidido ir lá fora apenas por vontade de olhar o movimento da rua, porque quando Rachel abriu a porta traseira para pegar as bandejas de comida, sentiu uma presença a mais atrás de si e percebeu se tratar da loura.
"Você veio." Olhou para dentro do carro identificando o que a morena estava indo pegar. "E trouxe comida. Não precisava. Eu não pretendia deixar que meus convidados morressem de fome, sabe?" Disse divertida empurrando suavemente a morena para o lado, pegou a bandeja de brownie e deu para que Rachel segurasse, enquanto pegou a outra bandeja e fechou a porta.
"Apesar de nunca ter participado de uma de suas festas, ou de qualquer festa, tenho pleno conhecimento de que você é uma ótima anfitriã, Quinn, mas meus pais me ensinaram a sempre levar algum prato de comida ou presente quando fosse convidada à casa de alguém." Ativou o alarme do carro que automaticamente travou todas as portas.
"De qualquer forma, obrigada, mas repito, não precisava." Abriu a porta de entrada e gesticulou para que a morena entrasse primeiro, então fechou a porta atrás de si. Rachel deu uma rápida olhada no interior da casa. Por fora, já era possível ter uma ideia de quão grande a casa era, mas por dentro, parecia ainda maior. E tudo estava perfeitamente organizado e combinando. Desde a decoração aos móveis pareciam caros e a morena temeu em quebrar alguma coisa.
"Você tem uma bela casa, Quinn. E a decoração é fabulosa."
"Foi reformada depois que Russell foi expulso daqui." Deu de ombros seguindo caminho e indo até a cozinha. Colou a bandeja com lasanha dentro do forno e a de brownie sobre a mesa junto de outros pratos. Dois deles, Rachel reconheceu serem veganos e olhou de forma questionadora para a loura. "Eu disse que não pretendia deixar meus convidados morrerem de fome. Logicamente, se você vinha, eu não podia deixa-la comendo apenas salada e tomando água."
"Quinn, é muito delicadeza da sua parte. Eu não sabia de que estava a par do meu veganismo." Disse sorrindo tanto pelo gesto como pela ironia das próprias palavras. "Desculpe causar problema por conta do meu tipo de alimentação. Eu posso quitar com você depois, basta me dizer o preço que eu"
"Quem não sabe algo sobre você? Logo você que fala até para quem não quer ouvir sobre seus hábitos, manias e desejos." Rachel corou e permaneceu em silêncio. "E eu convidei você, lembra? A comida e a bebida são por minha conta. Essa é da ideia de festa. Comida e bebida de graça."
"Oh. Está bem." Passou a brincar com a barra da blusa que usava, sem saber o que dizer.
"Acho que nunca a vi de calça fora das apresentações do coral." Quinn parecia analisar a veste da morena, a encarando de cima a baixo deixando Rachel consciente de si mesma. "Eu não esperava realmente que levasse a sério quando eu disse para usar algo com mais pano. Acho que eu esperava por um vestido." Deu de ombros. "Você fica bem de calça."A morena corou, sem parar de brincar com a barrar da blusa.
"Obrigada, Quinn." Levantou o olhar e prestou atenção no vestido da outra. "Você está muito bonita. Não que já não fosse, mas esse vestido realça seus olhos e o colo dos seios sem que seja de uma forma vulgar. E seu colar, apesar de simples, complementa sua vestimenta."
"O colo dos meus seios?" Arqueou uma sobrancelha e Rachel percebeu o que dissera e corou mais ainda voltando a encarar o chão em silêncio. "Ninguém nunca me elogiou além de simplesmente dizer que estou bonita ou legal. E, com certeza, não sem querer meu corpo." Sorriu de lado com o óbvio constrangimento da outra."Ou você quer meu corpo?" Rachel a encarou surpresa e começou a gesticular freneticamente.
"N-não! Quero dizer, eu poderia facilmente querer sim, digo, não somente seu corpo" Fechou os olhos e respirou bem fundo antes de encarar a loura. "Você é esplendorosamente linda, Quinn, mas você é bem mais do que isso. Eu ficaria honrada em te-la, mas não somente por causa da sua beleza." Disse suavemente fazendo a loura corar com a intensidade das palavras da outra.
Rachel estava mais do que embaraçada e tudo o que mais queria era sair correndo daquela casa e nunca mais ter de encarar a loura na vida. Talvez esse fosse o plano, fazer a morena corar até que entrasse em combustão e explodisse em varias estrelas douradas – e o quão dramática ela estava sendo?-. Sob o olhar atento da loura, esperava que os demais convidados aparecessem naquele momento, com câmeras de vídeo e rindo. Só então percebeu que a casa estava silenciosa demais.
"Quinn, onde estão os demais convidados?" Perguntou num misto de curiosidade e medo.
"Oh." Olhou para o relógio sobre a mesa em forma de galinha. "Você chegou na hora exata. Geralmente, as pessoas começam a chegar meia hora mais tarde do que o combinado."
"Pontualidade é importante." Colocou as mãos na cintura parecendo uma mãe prestes a dar uma bronca no filho pequeno.
"Quer comer ou beber alguma coisa? E enquanto esperamos, podemos ver algum filme na sala."
A morena estava mesmo com fome. E se fosse sair correndo daquela casa em alguns minutos, preferia faze-lo alimentada visto que sua próxima refeição seria apenas o almoço do dia seguinte – seria estranho voltar para casa tão cedo e antes de ter tomado café na senhora Kimmel.
Quase uma hora depois, ambas estavam focadas na televisão, mas não no filme que passava. Quinn não sabia como agir perto da morena que, por sua vez, estava em alerta ao menor sinal de perigo contra sua pessoa. Foi um alívio – e um novo início de ansiedade para Rachel – quando a campanhia tocou e o barulho de conversas e cumprimentos começava a encher a casa. Uma hora depois, e a casa estava cheia de gente. Todos do grupo de coral estava lá, junto de alguns jogadores e outros alunos da McKinley. Rachel estava no sofá, entre Tina e uma líder de torcida. A morena segurava um copo de alguma bebida, mas não a consumia. Além de precisar estar sóbria quando fosse o momento da pegadinha, precisava estar bem para dirigir.
Contudo, os minutos passavam e ninguém parecia prestes a fazer algo contra ela. Todos pareciam simplesmente se divertir e a ignoravam. Os únicos que falaram com ela, apenas para dizer oi, foram os demais membros do Nova Direções. E Quinn, vez ou outra, perguntava se ela estava com fome, se gostaria de algo para beber, ou se precisava de qualquer outra coisa.
Da última vez que a loura perguntou isso, Rachel mordeu a língua para não pedir que o que quer que a loura pretendia, executasse logo porque seus nervos a estavam matando, além disso, já havia passado seu horário de dormir e seu corpo estava cansando.
No lugar disso, pediu um copo de qualquer bebida e sorriu polidamente quando recebeu um sob o olhar desconfiado da loura.
Duas da manhã e sem drama algum, Rachel se viu, as últimas duas horas, escondida na cozinha. E na última hora, passara a servir quem quer que entrasse e pedisse por algo para comer ou beber. Havia acabado de dar o último pedaço de brownie a um aluno que ela reconheceu de sua aula de álgebra, quando voltou a sentar e Quinn entrou no cômodo parecendo indignada com alguma coisa. Rachel ficou tensa, achando ser aquela a hora que receberia raspadinhas sem fim na cara. E talvez fosse empurrada na piscina. Ou trancada em algum baú e enterrada viva.
"Onde você estava todo esse tempo?" Perguntou a loura gritando para abafar a música alta e ser ouvida.
"Eu estava aqui." Respondeu no mesmo volume, mas num tom de culpa.
"E porque diabos você está aqui? Caso não tenha percebido, está tendo uma festa lá fora."
"A festa está maravilhosa, Quinn. Todos estão se divertindo. Entretanto, não sou acostumada a ficar longas horas acordada. É de extrema importância regular as horas de sono e relaxamento mental e eu levo isso muito à sério. Meu horário de dormir foi horas atrás e sinto-me cansada, mas acredito sermos as únicas sóbrias aqui e seria egoísmo meu deixa-la com todo o trabalho de limpeza."
"Você está cansada, mas se recusa a ir embora para esperar todo mundo ir e então me ajudar na limpeza?" Disse incrédula e olhando para a outra como se Rachel tivesse anunciado sua perda de voz. Bom, talvez para a loura fosse uma notícia boa, mas não seria para a morena. "Você sempre consegue me surpreender." E sorriu, deixando Rachel sozinha novamente e começando a servir um jogador que entrou logo depois da loura partir.
Meia hora depois e a casa estava vazia. Rachel piscou achando ter dormido na cadeira, ainda na cozinha, ou talvez tivesse batido a cabeça e estava em coma porque logo que Quinn saiu da presença da morena, finalizou a festa e ordenou que todo mundo ajudasse a recolher o lixo ou a ressaca seria o pior dos problemas. Até quem havia ficado inconsciente por conta da bebida, acordou e ajudou de alguma forma a limpar a sujeira. Copos, garrafas, pratos de plástico e canudos foram separados em sacos de lixo, enquanto vômitos, líquidos e comidas eram limpos do chão ou de qualquer superfície que se encontravam.
Puck acabou dando carona para Finn e Artie, enquanto Santana e Brittany, há muito tempo já haviam ido para um dos quartos de hóspedes. Rachel ainda não acreditava que a loura expulsara a todos para que pudesse finalmente ir embora e dormir.
O que levava a outro problema: ela não poderia ir para casa até que amanhecesse. E, de forma alguma, iria pedir para ficar. Então, para onde iria?A ideia inicial era estacionar no jardim de um de seus colegas e dormir no carro, mas todos haviam ido e ela não queria simplesmente amanhecer no gramado de alguém.
"Preciso de uma vassoura, panos e produtos de limpeza e luvas." Disse Rachel após fechar a porta para o último convidado.
"Para quê?" Perguntou Quinn. A morena precisava ganhar tempo para pensar onde dormiria, mas a loura não precisava saber disso.
"Apesar de todo o lixo ter sido recolhido" Apontou os três sacos de lixo cheios ao pé da porta. "o chão e diversas superfícies da casa continuam sujas. Além disso, alguns móveis e objetos foram tirados do lugar."
"São três da manhã. Depois de dez horas de sono e cinco xícaras de café, eu termino de arrumar a casa."
"Não é nenhum incomodo para mim, Quinn."Insistiu.
"Mas é pra mim." Franziu o cenho.
"Oh. Certo." Cruzou os braços num gesto de defesa. "Então acho melhor eu ir." Talvez pudesse ficar no estacionamento de algum restaurante. Ou mesmo na escola.
"Se você faz tanta questão, pode dormir aqui e me ajudar depois. Em um horário humano, claro."
A morena a encarou surpresa. Pensou que, talvez, esse fosse o plano. Faze-la dormir lá e ataca-la durante seu sono enquanto estivesse em seu momento mais vulnerável, mas estava tão cansada que deu de ombros e aceitou a oferta. Quinn a guiou a um dos quartos de hóspedes, mostrou onde cada coisa do banheiro ficava e lhe estendeu uma roupa mais confortável para dormir. Rachel agradeceu, se trocou e afundou na cama aconchegante dormindo rapidamente.
Algumas horas depois, a morena acordou sentindo um peso a mais sobre o estômago. Abriu os olhos, piscou algumas vezes até a visão entrar em foco e olhou para o braço sobre si. Adrenalina correu seu corpo e tudo que conseguiu pensar foi 'é agora'. Contudo, nada aconteceu. Olhou para o lado e viu Brittany deitada, colada a si e franziu o cenho. Delicadamente, retirou o braço de cima de si, e sentou. Teve uma surpresa maior ao encontrar Santana do outro lado da dançarina e rapidamente olhou ao redor reconhecendo o quarto. Era o que Quinn havia lhe mostrado algumas horas atrás. Podia ver suas roupas organizadas sobre a pia do banheiro. Então não foi ela quem invadiu o quarto das duas, mas elas duas quem invadiram o quarto de Rachel.
A pergunta era: por quê?
Levantou vagarosamente, com medo de acordar Santana, e saiu do quarto quase correndo chegando a tropeçar na saída e cair sentada no chão. Ouviu risos abafados e olhou para trás. Quinn estava de pé, usando uma blusa cinza até os joelhos, o cabelo apontando para todos os lados – mas que a fazia parecer selvagemente sedutora – e os olhos um pouco vermelhos de quem teve poucas horas de sono.
"Você não parece ter o mesmo equilíbrio dos ensaios quando acorda." Comentou divertida, enquanto a morena se levantava.
"Meu equilíbrio é perfeito, muito obrigada." Disse indignada. "Santana e Brittany estão no mesmo quarto que eu, sobre a mesma cama em que dormi. Sei que não adiantaria explicar para Santana que foram elas quem invadiram meu espaço pessoal, então decidi sair o mais silencioso e rapidamente possível."
"Brittany é um monstro dos abraços. Seja lá onde você esteja dormindo, mas estiverem na mesma casa, você vai acordar com ela abraçada a você."Gesticulou para que começassem a andar.
"Mas por que eu? Santana não basta?"
"B tem essa obsessão por tocar você." Rachel corou fazendo Quinn se divertir mais ainda. "Geralmente, ela invade o meu quarto e acordo com ela e S em cima de mim, mas, de alguma forma, B sabia que você estava dormindo aqui e, no meio da noite, entrou no seu quarto."
"Estou mais surpresa pelo fato de Santana ter aceitado dormir na mesma cama que eu." Entrou na cozinha logo depois da loura. "E não ter tentado me sufocar." Disse mais baixo, fazendo Quinn rir.
"O que você quer para o lanche?"
Rachel olhou para o relógio-galinha e arregalou os olhos vendo que era quase três da tarde.
"Preciso ligar para os meus pais!"
"Pode usar o telefone da sala, se quiser." Deu de ombros. "Mas o que você quer para o lanche?" Repetiu.
"Vocês gostam de burritos?"
"Sim."
"Então deixe os ingredientes sobre a mesa. Depois que eu falar com meus pais, preparo os burritos."
"E o que você vai comer?" Ergueu uma sobrancelha.
"Sobrou um pouco da lasanha que eu trouxe ontem." E saiu da cozinha indo até a sala, em direção ao telefone sobre um criado mudo.
Seus pais estavam preocupados e enfurecidos. Haviam ligado várias vezes e deixado várias mensagens, até que decidiram ligar para a senhora Kimmel. Ficaram surpresos quando John, o filho mais novo dela, atendeu ao telefone e confirmou de que estava passando alguns dias com a idosa e de que Rachel não havia ido lá nas últimas 48h. Também disse que a garota sempre foi uma pessoa muito boa e que se havia dado uma informação enganosa, com certeza, foi por uma boa razão. Leroy agradeceu chorosamente, era difícil alguém que não fosse da família elogiar sua filha, mas logo gritou pela casa, acordando Hiram e dizendo que – finalmente e infelizmente – a filha deles havia entrado em sua fase rebelde de adolescente.
Rachel não quis contar a verdade pelo telefone. Pediu sinceras desculpas aos pais e disse que logo que chegasse em casa explicaria a situação. E pediu que seu pai acalmasse seu papai e assegurou que não, não havia entrado em sua fase rebelde de adolescente.
"Problemas?" Perguntou Quinn vendo a morena entrar na cozinha parecendo abatida.
"Como não atendi meu celular e nem respondi as mensagens deles, meus pais se preocuparam. Papai não parava de falar ao fundo que eu havia entrado em minha fase rebelde." Quinn sorriu e apontou para os ingredientes postos sobre a mesa.
Quinze minutos depois, os burritos estavam prontos quando a campanhia tocou. Quinn foi atender e, três minutos depois, voltara com uma sacola de compras de supermercado. Começou a dispor os produtos no balcão e Rachel franziu o cenho vendo ingredientes veganos para burritos.
"Eu provei da lasanha e está com um cheiro horrível e um gosto de vodca misturado. Então liguei para o supermercado que minha mãe costuma pedir coisas." Deu de ombros.
"Não precisava, Quinn, mas muito obrigada por isso. Quando lhe devo?"
"Nada. O que eu disse sobre não deixar convidados morrerem de fome ainda está valendo."
"Yo." Disse Santana entrando na cozinha e sentando em uma das cadeiras ao redor da mesa. Seu cabelo estava volumoso, lembrando uma juba, mas ainda assim a latina continuava linda. Logo depois, Brittany entrou no cômodo, com o cabelo perfeitamente no lugar e indo diretamente em direção a Rachel, a abraçando.
"Você é o melhor urso pelúcia de dormir, El. Mesmo não sendo um urso e nem ser de pelúcia, mas você é quase pequena quanto e também é bem quente." A morena corou e encarou Santana que estava concentrada na xícara de café que Quinn a serviu.
"Quem fez burritos?" Santana perguntou encarando Quinn que apontou na direção de Rachel que ainda era abraçada por Brittany. "Se eu passar mal, te afogo na pia."
"Não subestime minha habilidade culinária, Santana. Até hoje, nunca ouvi nenhuma reclamação."
"Eu gosto da comida que você faz, El." Beijou-lhe um lado do rosto e foi sentar junto da latina que começava a se servir.
Em um dia ao acaso, quando Quinn encontrou com a diva no hospital – que ironicamente foi o mesmo que dera a luz -, decidiu parar de fugir do que sentia e agir. Convidou a morena para uma festa – teria dois dias para organizar uma, mas tudo bem – e esperou. Na manhã de sábado estava ansiosa, com metade das roupas jogadas sobre a cama. Nada parecia bom o bastante. Cogitou ligar para Santana e pedir ajuda, mas a latina, com certeza, iria fazer piadas depois. Pensou em ligar para Brittany, mas a loura estaria com a latina e daria no mesmo: piadas.
Depois de passar o dia arrumando a casa e ir buscar as bandejas de comidas e as caixas com bebidas, esperou paciente pela noite. Havia finalmente decidido a roupa, então ficou no quarto, deitada na cama, lendo um livro. Sua mãe havia sido avisada sobre a celebração- sem-motivo que faria na casa e saiu mais cedo indo dormir na casa de uma amiga.
Desde a separação de seus pais, Quinn havia se aproximado da mãe como nunca antes. Passaram a conversar mais abertamente e a se conhecerem melhor. Judy ficara surpresa ao perceber que sabia tão pouco sobre a própria filha. A irmã de Quinn também passou a visitar mais a mansão Fabray e até ligou algumas vezes para irmã mais nova para saber como ela ia e o que estava fazendo. Judy também passou a ser uma pessoa mais sociável e divertida, fazendo amizade aonde chegava.
Arrumada, olhou para o relógio e viu que faltava pouco tempo para o horário combinado, mas ela sabia que as pessoas chegariam bem depois. Desceu dirigindo-se para a sala, veria um filme enquanto esperava, quando recebeu uma mensagem de Santana dizendo que Rachel havia saído de casa – a avó da latina morava na mesma rua da morena -. Quinn decidiu ir até a porta de entrada da casa. Conhecendo a diva, ela seria a primeira a chegar. Quando abriu a porta, viu o carro da morena estacionado e Rachel buscando por algo no banco traseiro.
Após ajudar a diva com as bandejas que trouxera, e servi-la de algo para comer e beber, sentaram-se no sofá na sala e começaram a ver um filme. Quinn queria puxar algum assunto ou sugerir qualquer outra coisa para fazerem, mas não sabia como agir. Percebera a morena tensa e, vez ou outra, olhar por cima do ombro como se esperasse alguém ou algo acontecer.
Infelizmente, Quinn não podia culpa-la. Rachel, com certeza, esperava por alguma pegadinha.
Quando finalmente os convidados começaram a chegar, a loura achou que a outra fosse ficar mais confortável sabendo que realmente haveria uma festa, mas quanto mais gente chegava, principalmente depois de todas as líderes de torcida e alguns jogadores aparecerem, a morena parecia prestes a ter um ataque de nervos. Nem mesmo com a presença de todos do Nova Direções, ela pareceu se acalmar. Aliás, percebeu que a única interação entre eles foi na chegada. Quinn tentava compensar, de tempos em tempos perguntando se Rachel queria algo para comer ou beber, ou se precisava de qualquer outra coisa. Na última vez que perguntou, percebeu que a morena queria finalmente dizer alguma coisa, mas, no fim, pediu por uma bebida – ainda que, mais tarde, a loura visse o copo ainda cheio, intocado.
Num certo momento, Rachel pareceu ter sucumbido ao medo e fugido da festa, mas Quinn viu que o carro da morena continuava lá fora e soube que a cantora estaria por algum lugar da casa. Procurou até no closet do próprio quarto, mas não a encontrou até ouvir que havia alguém servindo as pessoas na cozinha. Irritada, foi até lá e viu a morena sentada em uma cadeira parecendo cansada.
Rachel realmente estava cansada. Entre ficar em alerta, com medo de mais uma humilhação, e servir as pessoas, a morena seguia rigidamente o horário de dormir que havia passado há horas, mas não se negava a ir embora porque não queria deixar a loura sozinha para limpar a bagunça dos outros. Quinn não entendia como alguém podia ser tão altruísta – ainda que a morena tivesse seus momentos de diva – e decidiu fazer algo pela outra – além de uma festa estúpida que não serviu ao propósito inicial – e mandou todo mundo embora não sem antes de ajudar a limpar a casa. Trinta minutos depois, Santana e Brittany já haviam ido dormir – a loura preferiu acreditar que sim -, mas Rachel ainda queria terminar de limpar a casa. Quinn conseguiu persuadir-la em dormir lá e ajudar no resto da limpeza mais tarde.
O café da manhã mais tarde, foi preparado pela diva que, mais uma vez, provou cozinhar bem. Até Santana repetiu o prato, ainda que não fosse admitir nunca de que tinha gostado. Depois que todas haviam alimentado-se, Rachel disse que precisava ir para casa. Quinn ainda tentou ganhar mais tempo com a morena, mas entendia que ela precisava ir – além de não estar muito à vontade na presença de duas das pessoas que mais lhe fizeram mal -.
Quinn demorou a perceber que estavam paradas há algum tempo. Franziu o cenho vendo a morena olhar para um lado e para o outro, decidindo que caminho tomar.
"Você sabe para onde estamos indo, certo?"
"Claro que sei." Continuou encarando um dos corredores, tentando lembrar onde ele parava. "Eu apenas estou em dúvida por onde ir." Virou de frente para a loura quando esta suspirou pesadamente. "Tenho plena noção de onde quero chegar, Quinn, mas percebo que estamos pegando caminhos mais longos e é de extrema urgência que eu consiga tira-la daqui a tempo."
"Você continua falando isso e eu continuo sem entender." Seu tom era de frustração. "Por que é tão importante que eu vá embora? Achei que fosse ficar feliz comigo aqui com você." Colocou as mãos dentro dos bolsos dianteiros da calça que usava, parecendo magoada.
"Você não lembra o motivo de estar aqui, Quinn. E por mais que eu queira estar na sua presença, na atual circunstancia que estamos, pedir por isso seria errado."
"Por quê, Rachel?" Falou alto, não agüentando tanto suspense. "E onde diabos estamos?"
"Vamos por aqui." Disse Rachel calma e simplesmente após alguns segundos, indo pelo corredor da direita, ignorando a explosão da outra.
Quinn estava irritada, frustrada e começando a perder o resto da pouca paciência que tinha. Havia aceitado o fato de estarem na escola, sozinhas e de que conseguiam mudar de ambiente em poucos segundos. Contudo, não aceitava ver Rachel tão determinada em tirar a loura de lá. Era como se a vida de Quinn dependesse de sair de lá.
E, mais uma vez, Rachel parou em frente a uma porta. Era a entrada de um dos banheiros do segundo andar. A loura ergueu uma sobrancelha duvidando de que aquela seria a saída.
O Breadstick nunca esteve vazio como estava agora. Mesmo sendo de dia – a luz do sol entrava sem qualquer barreira deixando impossível ver a rua, mas permitindo enxergar normalmente o interior do local -, sempre havia alguém por lá. Na verdade, nem os funcionários se fizeram presente.
Olhou ao redor e viu Rachel em uma das mesas, com o queixo sobre uma das mãos, parecendo entediada. Até que cruzou o olhar com o da loura e ajeitou-se melhor na cadeira deixando a postura ereta. Quinn andou em sua direção e sentou na cadeira de frente para a morena.
Uma ideia e muito tédio depois. Livre para sugestões, críticas, elogios e tudo o mais.
Sorrisos.