Eu havia imaginado que meu grande amor seria alguém de outro lugar. Que esbarraria em mim no Dover Mall. Literalmente. Eu estaria andando com Marlene e Dorcas. Ele dobraria uma esquina, usando óculos (de qualquer tipo), e nós trombaríamos um no outro.
"Opa, me desculpe", o garoto murmuraria e continuaria andando. Alguns passos adiante, porém, eu me viraria e veria que ele também havia se voltado. Ele estaria me observando, os óculos na ponta do nariz. Ele ergueria levemente uma sobrancelha e continuaria andando.
Na praça de alimentação, na fila do Ranch One, ele apareceria de repente atrás de nós. E nos conectaríamos sem palavras (que precisa de palavras quando se tem química?). Secretamente, eu ficaria feliz por ele ter me preferido a Marlene. Por uma única vez, um garoto bonito não a notaria. (Ele não seria mau nem nada assim; é que ele só teria olhos param mim.) Quanto a Dorcas, bem, até agora ela nunca admitiu gostar de nenhum garoto. Suas fantasias giram mais em torno de sorvetes sem gordura.
Marlene ficaria feliz por mim, mas com um pouco de ciúme. O que pode acontecer. Eu já me senti várias vezes feliz, e ao mesmo tempo com ciúme, em relação a Marlene McKinnon, desde o primeiro ano, quando ela se sentou no meu lado na cantina e perguntou: "Como é que você pode ler enquanto come?" Fiquei perplexa diante do fato de aquela linda menina, com cabelos longos e negros, olhos azuis e pele perfeitamente lisa, sentar-se a meu lado, eu, uma mera garota sardenta.
Não sou nenhuma nerd ou coisa semelhante. Meu cabelo ruivo é incomum, o que me agrada. Quando não está todo arrepiado. Meu corpo está ok. Exceto pelas minhas sardas, que me deixam maluca. Elas pipocam por toda parte quando passo por uma janela, por exemplo. Eu uso filtro solar o tempo todo, mas isso só faz meu rosto parecer oleoso e sardento. E minha pele branca fica logo vermelha. Tudo que um professore precisa fazer é dizer meu nome e eu instantaneamente coro e começo a suar. Mamãe diz que um dia eu vou parar de corar. Mas, então, ela suspira: "O suor é para sempre."
Volto a minha fantasia da praça de alimentação. Meu garoto perfeito caminharia até a minha mesa. Eu mergulharia uma batata frita no molho de churrasco e ele se inclinaria, aproximando-se do meu ouvido e dizendo: "Vai ter uma festa em Dover."
Eu diria: "Ah, é?"
Ele perguntaria: "Quer ir?"
Eu responderia: "Claro", sem me preocupar com o fato de que mamãe ficaria enlouquecida ou se perguntaria como eu iria até lá ou como voltaria apara casa. Então ele perguntaria: "Onde posso pegar você?" e eu saberia que ele não só era um cavalheiro, como também tinha 16 anos.
Só de olhar para ele, eu derreteria por dentro.
Naturalmente, minha visão está tão longe da realidade que até poderia se passar em Marte. Mamãe não me deixa ir nem ao Dover Mall sem ela. O que dirá a uma festa? Com um garoto? Num carro? É, certo, eu teria mais sorte se tentasse convencer mamãe a fazer um piercing no próprio umbigo. ("Vai ficar legal! Todas as mães estão fazendo!")
Isso nunca iria acontecer comigo.